Desde 2019, Lucinéia Alves, 42, aguarda a quinta cirurgia na região pélvica, para tentar se livrar da dor intensa que a acompanha há oito anos. O tão aguardado procedimento havia sido reagendado para 2020, mas teve de ser suspenso por causa da pandemia. “Há seis anos, só consigo dormir na mesma posição, de barriga para cima, e não consigo brincar com a minha filha. Sinto dor 24 horas por dia”, relata.
Lucinéia é uma das 32 mil pessoas que aguardam uma cirurgia considerada eletiva na rede pública de Belo Horizonte. O número, porém, pode cair em breve com a liberação de procedimentos cirúrgicos realizados em ambientes ambulatoriais por parte do Estado, por meio do Comitê Extraordinário Covid-19.
Enquanto a retomada não acontece, a fila de pessoas à espera de uma cirurgia eletiva só aumenta – elas ficaram suspensas por boa parte da pandemia. São dez mil pacientes a mais que a fila registrada em novembro do ano passado, com residentes da capital e de mais de 500 municípios pactuados que estão cadastrados na Central de Internação da Secretaria Municipal de Saúde.
“Vou correr até o posto, até porque também estou na fila da ressonância magnética. Agora, estou com esperança de ficar sem dor”, diz Lucinéia, que foi diagnosticada com prolapso uterino com cistocele e está sem trabalhar há quatro anos por causa da doença.
RETOMADA SERÁ GRADUAL
De acordo com a PBH, a retomada das cirurgias tem início ainda nesta semana, de forma gradual. Para que não faltem medicamentos, os hospitais devem fazer monitoramento detalhado dos estoques dos fármacos utilizados nos procedimentos de ventilação mecânica e sedação.
A Santa Casa de Belo Horizonte, maior hospital de Minas, está organizando a fila das eletivas, para priorizar os casos considerados de maior gravidade e complexidade. “Temos algumas limitações, especialmente sobre o suprimento de medicamentos, como relaxantes musculares e analgésicos. Fizemos uma importação grande e acredito que vamos tocar as cirurgias assim que isso for regularizado”, afirma Guilherme Riccio, diretor de Assistência à Saúde da Santa Casa.
Ele explica que há uma grande fila de pacientes à espera de uma cirurgia agendada, mas o sistema de saúde não teve escolha. Foi preciso interrompê-las devido ao enorme número de pessoas internadas por causa da pandemia. “A Santa Casa se tornou referência no atendimento de pessoas com Covid, e o bloco cirúrgico durante um tempo teve de ser usado para o tratamento intensivo de Covid e isso foi muito importante para o enfrentamento da pandemia em BH”.
Aos poucos, com a queda dos índices da doença na capital, os leitos de Covid estão sendo desativados na Santa Casa – entre eles, 20 leitos do bloco cirúrgico.
A Secretaria Municipal de Saúde informa que desde novembro do ano passado, seguindo recomendação do Ministério da Saúde, suspendeu as cirurgias eletivas no SUS-BH por causa da pandemia.
Devido ao aumento da taxa de ocupação de leitos de UTI, desde o dia 12 de março, a prefeitura reforçou esta suspensão, determinando ainda que serviços privados procedessem da mesma forma, seja para procedimentos de médio ou de grande porte, até a melhoria dos indicadores assistenciais.
À ESPERA DO TELEFONEMA
A jornalista Lúcia Santos, 42, espera ansiosamente por uma ligação de uma Unidade de Referência Secundária (URS) para agendar uma cirurgia eletiva. Ela está entre milhares de pessoas que entraram na fila por um procedimento cirúrgico no primeiro semestre de 2021, em um hospital da capital.
Em novembro, após uma forte crise de dor na coluna e no nervo ciático, ela teve de lidar com uma perda na mobilidade na perna esquerda.
O comprometimento motor levou a outro problema: a incapacidade de fazer a dorsiflexão do pé, também conhecido como pé caído. A jornalista agora precisa de uma intervenção cirúrgica no tendão para recuperar o movimento.
“Isso interfere em várias coisas, especialmente na caminhada. No começo eu mancava muito, melhorou com a fisioterapia, mas eu ainda puxo muito a perna, porque o pé não sai do lugar”, conta Lúcia, que entrou com o pedido de procedimento em abril, mas sem expectativa de quando poderá voltar a andar normalmente. “Na unidade de saúde, deixaram bem claro que não teria previsão para cirurgia acontecer, por causa da pandemia”.
Não há um levantamento de quantas pessoas aguardam por uma cirurgia eletiva na rede pública em Minas. Segundo a Secretaria de Estado de Saúde, a gestão do acesso, priorização e agendamentos de procedimentos e cirurgias dessa natureza são de responsabilidade das secretarias municipais de saúde.
“Assim, os municípios têm autonomia para estabelecer fluxos, critérios e gerir as solicitações destes tipos de cirurgias”, afirma a pasta por meio de nota.